quinta-feira, 19 de março de 2015

Refém voluntária

Ilustração: Lu Gomes

Era dia de eleições presidenciais e ela não queria competir com os líderes principais, os políticos. Dois eram os favoritos de Júlia, cansada da luta. No dia da votação, o que ela mais sentia, ao deixar as urnas, era sono e tesão. Chegando em casa, queria morgar. Também queria carinho, beijinho, parceria no colchão. Mas ele tinha pulado antes das cinco. Precisara levantar cedinho para trabalhar. E claro, votar.

Aquele dia dentro de casa, Júlia ficou à espera, leoa no cativeiro. Vestiu-se de presidiária, como ele gostava. Ela era dele, de ninguém mais. Tanto que nem se decidiu entre os candidatos. Só justificou ter nascido em outro Estado. Então cozinhou, fez um delicioso feijão. Quando ele chegou, cansado e derrotado, ela o recompensou. Matou a fome dele, de leão, sendo comida à vontade. Era disso que Júlia gostava: ser refém voluntária.

Ilustração: Lu Gomes