segunda-feira, 8 de fevereiro de 2016

Rotina profissional sem zika

Ilustração: Lu Gomes

Obcecada por higiene, Emanuelle gostava de usar vestido branco nas noites calientes de verão. Casual no guarda-roupa, profissional no batente. Ia direto ao ponto e pronto: fazia seu trabalho. Nas raras vezes em que dava tudo, exigia camisinha. Era sempre ela quem decidia o programa, dependendo do que estivesse afim. Inovadora, enfim. Emanuelle não atendia pensando no bolso. Ela obedecia seu coração. Tinha vontade? Ia. Não queria? Ficava. Tinha dessas, a rua. Especialmente a travessa que Emanuelle dominava.
Junto com a liberdade, agora Emanuelle queria limpeza na área. Absoluta na quadra, decidiu hastear bandeira: naquele ponto da cidade, não haveria espaço para artrópode da moda algum. Ou ela ou o mosquito do zika, terror da última estação. Que reinasse ela sozinha no mapa, então. Passou a chegar uns minutos mais cedo (ela era pontual) do que de costume e, cheia de graça, tirava com uma vassoura possíveis garrafas quebradas, papéis, sacos plásticos, copos descartáveis, tudo o que pudesse juntar água parada e atrapalhar seu negócio. Claro que dava preguiça, mas daquilo dependia uma vida. Ou várias. Depois do trato no espaço, Emanuelle lavava as mãos e até as pulseiras no bar do Zé. Passava um creminho de tangerina, retocava o batom e, mãos macias, carregava na malícia, sorrindo e fazendo (quase tudo) que o cliente pedia. Se ele quisesse, ela esticava o programa, à moda da grana: "Paga?". Se sim, leva. O melhor do business de Emanuelle era sua boca carnudinha. A danada sabia o que fazer quando alguém penetrava aquele espaço oco. Até quando não fazia nada era gostoso, só sentindo para ver. Magic Emanuelle... A garota era um ser criativo. Dona de si, seguia com a língua um compasso só dela, indo e vindo na direção certa, para cima e para baixo, mais lento ou mais rápido, mordiscando e lambendo, e os lábios cada vez mais molhados e escorregadios, Aquele vai-e-vem era alucinante, pena que ela só atendia no carro. E nunca dava tudo, só a boca. Mas com ela, fazia de tudo. No fim, o que muitas não queriam, ela fazia gostoso: engolia in-tei-ro. E se exibia, olhando para o cliente de baixo para cima, com o troféu de ouro que, naquele instante íntimo, era dela. Assim ela fazia, era sua rotina. Rotina de profissional.

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